10.21.2016

desejo

a moça no café serve o líquido quente e eu
apressado
queimo a língua e o céu da boca
estrelado
grita sem pressa que tá cansado
ele queria
o céu as estrelas e os membros estatelados
no sofá duro
um dia inteiro pra ler poesia
abrir um espaço
um intervalo
pra lembrar que existir pode ser degustar
calmo
o instalar das horas

10.12.2016

o tempo que leva
um silêncio

o tempo que dói

10.01.2016

eu queria uma palavra calma
um sussurro
um silêncio
um barulho
intensivo

não é um gemido, nem um suspiro
não é pensamento não é sentimento
não 
é uma palavra que não existe
por isso não tem
forma nem tamanho

uma palavra que não é som nem imagem nem sentido
um estar-comigo
infinito que dura um
deitar na cama
um
fechar de olhos
um não-ser e nem estar-em-mim
 


7.17.2016

tristeza

eu olho pra foto, minha imagem que você registrou
nela não existe nada de errado
eu olho pra câmera, corpo curvado

você olha pra mim
eu olho pra você

quando eu vejo a fotografia, é como se eu estivesse
junto de você
imagino suas mãos sustentando a câmera, imagino seu dedo apertando o botão
imagino seus pensamentos
eu me sinto perto de você então
você no passado
e o presente vira apenas asfixia

no meu olhar naquela pose
--eu lembro--
--eu acho que eu lembro--
está contida uma crença enorme, que me movia
 
nunca seria possível que aquela foto não fosse eterna

aquela proximidade, aquela relação
onde será que tudo deu errado?
aonde será que aquele tempo tão certo
seguro
contínuo
que sustentava o meu sorriso, a minha cabeça
sobre o meu pescoço
meus braços levemente flutuantes
aonde será que foi aquele tempo?

eu vejo a foto e a foto me diz
saudades

7.07.2016

caderno de sensações 3

esse calor que gruda na minha pele
me faz lembrar do tempo que eu não terei mais

às vezes é tão difícil de respirar

- quando pára de doer?
- nunca pára


será que o amor se mede pela falta de ar? pela dor nas costas? pelo tamanho do espaço vazio, fincado na minha nuca, atrás do meu pescoço?




7.02.2016



o tempo às vezes dói  ........ . ... .. . .. . ..  ... . .  ....  ...... . .   . .. . .      .


...... . . . . .. .. . ... .. . ..  . .      .   .       . .    .     . . como poeira dentro dos olhos

costume

ele trocou de óculos, agora eles são de um plástico que brilha, reluz a luz que encosta neles.
as lentes são um pouco menores, preço bom, feitura rápida. praticidade moderna, contemporânea, desenvolvida, de primeiro mundo.

desde então, parece que não consegue ver muito bem. enquanto caminha, o piso se distancia, ele se mareia, tropeça. precisa parar para respirar e pensa:

é preciso olhar apenas para um ponto, sempre o mesmo ponto, nunca se esqueça. assim, quem sabe, a vista se acostuma.
 
já faz uma semana, a vista não se acostumou. 
mas vê tão mais nítido e, ao mesmo tempo, não vê mais nada.
é a lição do cinema: quanto mais nitidez, menos se enxerga. a potência da visão é a medida inversa do tamanho da nossa alma.

esses dias ele sabe muito bem disso: olhar não significa muita coisa. cada vez mais ele se pega questionando:

"onde está o que eu vejo?"

não sabe mais delimitar espaço, nem tempo, nem começo nem fim. perdeu as referências. será que o que deixou de ver deixou de existir? ou apenas saiu de foco? ele não vê nada, mas se move assim mesmo.

é preciso olhar apenas para um ponto, sempre o mesmo ponto.
quem sabe a vista não se acostuma?

um exercício diário, imposto pelos olhos, pelos óculos, pela globalização, mobilidade, e o capitalismo avançado. precisava trocar de óculos?

"eu tinha tanto amor por aquilo que eu via antes."

deixar de ver é perder o mundo?
agora, ele anda por aí, sem chão, tentando olhar pro mesmo ponto. quem sabe assim não se acostuma?

6.20.2016

caderno de sensações 2

coisas que eu aprendi vivendo longe:

o calor na pele se parece com o sentimento de esperança
falar com pessoas queridas é igual a falar em português
céu azul é mais importante que uma casa grande
sentir saudades se parece com uma dor infinita

6.12.2016

a gift

from this vast distance i imagine everyday a sunshine for you
i calculate the time zones, i add and subtract minutes and hours
so the sun in mind, the wind in my arms, the blue skies in my belly can be
precisely synchronized to your waking hours and
your every breath
i imagine fresh air, tasty fruits, soft ground
a world to embrace you from the moment you awake

stuck at the corner of an odd little
far away bedroom that communicates nothing to me
in my mind, i imagine a home, a time, a present, and deliver to you
every day
that's my way to treat myself too
expanding space and time
from my tiny little squeezed up heart
i imagine life and meaning
and i imagine smile and i imagine all that
for you
it's like the work of an architect that will never end


5.19.2016

caderno de sensações 1

hoje eu fui ao mar
achei que, no lugar de terapia, sentir o mar me acalmaria
o céu estava azul, o sol brilhava forte, a água estava calma
mas
pela primeira vez
o mar me deixou triste
que triste é o mar--descobri isso hoje
estar lá e ver que o mar é outro
(talvez isso seja terapia: minha tristeza é do tamanho do mar?)

voltando no ônibus, tive vontade de chorar

5.11.2016

Acho que perdi as palavras

5.08.2016

tradução

talvez não estando
ficando calado
uma espera sem ruído
de solipsismo suave, auto-obliteração

a dor mora em outro coração
--eu reconheço--
e eu peço perdão

meu silêncio é meu cuidado

5.02.2016

exercício

eu queria dizer tudo
tudo
que eu sinto
mas eu sei que tudo não existe
e o que eu sinto é justamente aquilo que eu não sei
eu queria dizer que eu sinto tua falta
que eu queria poder te encontrar
perguntar "tudo bem?"
te dar um abraço, dormir do teu lado
te dar um beijo ao acordar e sentir o calor acumulado
no teu corpo
na tua respiração
queria poder ter longas conversas, dividir
o tédio das tardes mortas
da noites escuras, de luz amarela
as horas sem sentido, os gestos sem razão
queria sentir o formato da vida
das coisas
do tempo
na tua presença
às vezes eu acho que sinto falta dos nosso planos futuros
dos nossos momentos extraordinários
mas eu quero mesmo é o presente
pequeno, indiferente, comum
- esse parece que sumiu debaixo dos meus olhos-
não sei mais como habitar esse tempo longo, infinito
parado ao redor do meu corpo
a vida perdeu o formato e eu fico aqui, flutuando
eu queria dizer que eu sinto a tua falta
da tua voz, das tuas coisas, das tuas roupas, dos teus cheiros, dos teus cabelos
das tuas palavras, tão infinitas
dos teus olhares, dos teus gestos
eu queria dizer que eu sinto a tua falta
e das tuas palavras
e das minhas palavras, nas tuas palavras, nas minhas
sinto a falta do meu amor
eu queria dizer tudo
todo dia eu queria dizer tudo
mas não tenho quase nada a dizer

4.25.2016

morning, 10:30, and it's so late, but i can't get out of bed. i linger, the phone, the messages, the news, the words just rushing into my head through my eyes. another day, and it's sunny outside, i don't need the blankets, i'm gonna exercise, i need to work, get yourself together, hoje vai ser melhor, hoje vai começar a vida de novo, levanta, come, faz alguma coisa. 11h30, uma hora, already gone, it's so silent, vou escutar música, i can't stand the silence, i keep talking to myself, long conversations that make no sense, but take hours and hours and hours, e eu aqui, deitado nessa cama. there's no space for music, i'm sorry for my absence to myself. 12:30, i'm so hungry, what's going on with my life? my stomach gets me out of bed, café da manhã, ou almoço? it's been weeks that i haven't had lunch, because breakfast doesn't allow it to happen. such failure... que saudades, que saudades, que saudades, pounding on the edge of brain, de novo de novo de novo. i need to go home, i'm gonna leave academia, i need a simple life, but i like what i do, but i dislike what it asks of me. quero andar na praia, quero acordar com o sol na cara, quero encontrar meus amigos, quero me sentir calmo. quero me sentir calmo. quero me sentir calmo. i need to learn how to breathe again, when was the last time? yoga doesn't count, i'm controlling myself, that is practice. preciso sentir as horas leves, voltar pra mim mesmo. i feel so lonely, this city is so big, i wish i could be somewhere else. atravessar os oceanos, ver o céu, pisar no chão. there's no ground in this place, nothing is real, just my feeling of irreality. so silent so silent... eu tinha tanta coisa pra sentir, pra fazer, pra falar, pra pensar, pra trocar... but now i can only go back to bed. no, i'll drag myself out, take a walk, dar uma volta no quarteirão, bicicleta, rua, esquina, dobra à direita, dobra à esquerda, vai em frente... 17h, 18h, 19h, 20h. i'm smoking too much, tenho que fumar menos, um a menos a cada dia, até eu não fumar mais. todo dia todo dia, let me just go. escureceu, i wish i could be getting up somewhere else. muito silêncio aqui, esqueci como se escuta música, esqueci como se dança, preciso dançar...

4.18.2016

they say that one cannot split form from content, that content makes the form, and that form makes the content. the way one thing exists is also (obviously) the existence of that thing. if i shout or if i cry or if a whisper the same words, the sentences are not the same, because the feeling is different, because the form is different. they also say that mourning is work, the slow process of dealing with a sudden absence: it demands efforts. i keep the forms, that's my work. the shoes, the piece of paper, the things left behind stay in the same place. the hope of sunny days, of an open time to come, is embedded in the buildings, the streets, the houses, the seas, and the sky. i keep them. even after the content is not there anymore, at least the form will be. and i see it. and i imagine it. and i smell it. it's not denial, but a way of letting my affect slowly spread onto other places and things, to detach from its previous forms until it is everywhere and the pain is stored somewhere different, closer to the love. it takes time, and it takes breathing. that's my way of keeping the future alive, the future of a world, the future of the world as i imagined it to be, the future of my world too: inside, outside. of keeping alive, of moving even in times when my body feels so heavy, and my eyes keep constantly asking to be closed.

4.04.2016

to you

every second with you is like:

a deep breath

a breeze on my forehead

a long gaze on a falling leave

a tear forming on the corner of my eye

the arrival of nice smells

a light gesture with the big toe

half-sight half asleep

the most peaceful dream

a twilight after an all-nigther

the subtle certainty of goodness

 the silence of love


2.12.2016

amor

você pega a palavra
repete mil vezes
até que ela não é mais nada
você põe ela em cima do seu peito
amassa esmaga
ela não passa
ela só te olha desdenha te ameaça
a palavra
linda
não se deita com você não gosta de intimidade de nada
a palavra é impenetrável
fica calada
debaixo do sol a palavra amolece, mas você não toca ela não toca
a palavra se imprime
fundo
todo o seu fracasso