3.29.2007

Querer ser grande e ser pequeno
queimando sob o sol
esperei adormecer por inteiro ali
todos os músculos
e lembrei de cada detalhe da foto
em preto e branco
que pincei da memória do mundo que não foi meu.

Aguardo o próximo suspiro baixo ao meu ouvido
pra poder cair de novo e quebrar os ossos contra o chão.

Assim sinto-me
Todo vivo.


(lembança boa e poesia curta:
o navio que ancora e traz promessas de frescor e palavras cruas)

3.28.2007

Extrapolando Bergson
(ou conversando com o tempo)

"Não há percepção que não esteja impregnada de lembranças."




"Para evocar o passado em forma de imagem, é preciso poder abstrair-se da ação presente, é preciso saber dar valor ao inútil, é preciso querer sonhar.
Talvez apenas o homem seja capaz de um esforço desse tipo."



3.27.2007

Sem ver, perceber o mundo. Perceber e deixar correr.

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Olhei sem fim.
Enxarcou a camisa de lembranças e pedalou até cair dentro do mar. Enquanto afundava ao peso do seu corpo, dissipava - um a um - cada pedaço de memória incrustrado por entre os fios da trama. Algodão, tinta e um pouco de si e dos outros. A casa antiga, cheiro de madeira, primeiro beijo no escuro da festa, aviãozinho de papel e música fresca no domingo de manhã.
O sal ocupava lentamente as suas frestas que ficavam abertas. Sentia-se bem enquanto adormecia.

Esvaziou e flutuou leve em direção ao fundo. Um sorriso e muito gosto de agora.

3.14.2007

Ventou tudo

E eu fiquei.




(Ventou eu

E tudo ficou)
Não existe

o ponto exato entre

mim e todas as pessoas.

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Como uma galáxia inteira

engoli seco o dia.
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Ainda digerindo a distância

entre mim

e o que eu quero,

converso ao telefone com a minha consciência.


Estarei lá, como todos os dias. É só não falar.
Soprei as palavras sobre o papel
o pincel repuxou as dobras da consciência
esticou cada ruga
todas clareadas sob o dia azul.

Peguei os sons e espremi em passos
em gosto de gengibre e peixe cru
um pouco de sal
e longas tragadas
de coca-cola e Marlboro light.

As letras saíram felizes
intactas como o céu das noites de verão.

3.11.2007

Acordar e sentir o dia entrar pela narina.

Pegar o tempo e comprimir em manhã - com o cheiro de noite que vai se esvaindo conforme as horas passam.

E, entre um gole e outro de sonolência, dormir minutos, horas, abrindo um buraco fundo e brando nesse espaço. Semi-existir, vagar flutuando pelos quartos, sala e cozinha.

Prolongar a manhã até quebrá-la com a aspereza do meio-dia.

Aí relembrar da vida sensata e fria, estirada sob o sol forte que racha-lhe a face delicadamente construída no ar da pós-madrugada. (estraçalhar a poesia fina)

Entre o lilás e o amarelo saturado, morrer de novo até escurecer a vista e clarificar os pensamentos. Soltar o ar preso, viciado dentro do pulmão desde o primeiro sonho.

3.08.2007

Ensolarar

e depois escurecer.

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Peguei dois dias na mão.
O do meu pensamento, esmaguei contra o travesseiro.
O de fora da janela, fumei até queimar o lábio.

Fumaça branca e amarela. Azul que dói.
Hoje o sol secou o vento que soprava.

E assim respirei seco e ensolarado.
Voando sobre as árvores, filtrando os olhares na areia branca que não se mexia.

Não pensei em nada. Corpo solto, olhar e as coisas.