5.27.2008

Perceber pouco a pouco a pequena fuligem que se deposita aqui, em cima do meu corpo. Sumir um tanto dentro dela, ir cavando o meu solo confortável, de onde olho e encontro as pessoas. Um casulo aberto e transparente, onde sopra vento e respiração de quem quiser adentrar. Ali, podendo observar os segundos, consegui parar o tempo, esquecer o ruído do relógio, habitando assim uma outra forma, um novo modo.

***

Ir a São Paulo, ao bairro da Liberdade, é sempre um tanto conflituoso. Encravado no meio daquela cidade enorme está aquele lugar que me coloca dentro da minha própria casa. Não essa em que eu moro, mas uma casa abarrotada de pessoas, cheiro de remédio e alga amassada. Meu avô comendo de palitinho fazendo muito barulho ao sorver o caldo, tocando o sino budista de manhã. Aroma de incenso queimando e barulho de idiomas misturados. Em São Paulo me deparo com uma casa que não é só minha, mas é pública, compartilhada. Não domino, existo apenas. No meio dos gritos e correria, a calma do olhar é sempre o que desfaz a má impressão.

5.06.2008

Hoje a praia estava tão grande, grande como há onze anos atrás. Num espaço - coqueiros, céu azul escuro, ondas ao fundo e algumas pessoas caminhando, com pressa e com medo - uma linha (quebradiça) de acontecimentos fortuitos. Mas não os acontecimentos acontecidos, mas os existidos de alguma forma.

Por que os coqueiros impregnaram tão fortemente a imagem? Por conta do céu escuro que os escorava, num frescor de frente fria carioca, emulando alguns invernos mal-sucedidos, idas a restaurantes, livros em livrarias pequenas e abarrotadas, coca-cola com amigos, euforia de outrora. Dentro de uma inclinação à calmaria, impressionante como a mais calma das imagens pode ter como efeito o seu contrário. Ou talvez, a sua própria condição de existência.


***


Esquecer é, sem dúvida, das melhores formas de sempre se lembrar.

Não um retorno, mas uma sempre-ida que acaba transformando algo desde-sempre-igual em algo-a-todo-segundo-diferente.
De uma forma ou de outra, estar com tantas pessoas o fez imaginar-se só. A abundância parecia-lhe excessiva e, respirando fundo, conseguia encontrar uma certa tranqüilidade na pura ausência. Não um turbilhão, mas um zunido bem enfraquecido, translúcido, amarelado e levemente refrescante. O pisar de um pé após o outro - não o verbo, nem a ação, mas algo que fica entre as duas coisas - era-lhe inspirador a ponto de conseguir alcançar uma certa instância de vazio.

Nem dizer e nem ouvir, sem egocentrismo, mas uma tentativa de só ver, o tempo todo. Não ver o espetáculo, nem o mais escondido, mas ver ali, no meio, o que mais parece óbvio: nem poesia, nem informação, uma certa latência constantemente ignorada.