11.27.2005

Cliché 2

Penso.

Logo penso que existo como penso.
Penso que existo. Sem fim.

11.26.2005

Cliché

Pensamento saturado.
Não me orgulho de muita coisa. Talvez da última vez que consegui me orgulhar de algo. E só. Falta pouco para porra nenhuma. Ótimas previsões. Sempre.
Vermífugo escondido dentro de mim - o verme que parasita -, o apreço pelos outras nunca foi tão grande. Afinal de contas, para quê mesmo é isso tudo?
4h, 5h. Um pouco menos do que a noite toda. Tempo matado esvaziando a cabeça. Conversas sobre postes, e todo resto guardado junto com o consenso já bem debatido. Esquecer um pouco mais e, animais em quarentena, apreciar os detalhes repetidos e desgastados na cabeça. Astutas e presunçosas reviravoltas que não acontecem, mas são exageradamente anunciadas, os minutos parecem que são uma reprodução de um original que nunca foi, de fato, produzido. Um pouco de círculos, um noite como qualquer outra, e fecho os olhos com a certeza de pouca coisa. Amanhã é sempre um pouco parecido, e as coisas são ótimas e muito bonitas, e não precisam ser impressionantes.

10.05.2005

Organizando o dia-a-dia

Você sente e você sonha. Paisinho subdesenvolvido de merda. Devia virar um advogadozinho qualquer e ganhar muito dinheiro. Preciso voltar a pensar sobre o que me faz feliz. Afinal, vai tomar no cu todo mundo! Com essa pressão toda eu não consigo nem respirar. Pensa mais um pouco, agora de leve. Respira o ar da rua e olha um pouco pro céu. O dia tá bonito, e as pessoas são banais. Por que eu não posso ser também? Ah, vai pra porra com esse papo de qualquer coisa. Um dia, eu quis, achei que seria bom. Achei que seria possível. Um dia, o mundo esteve todo, redondinho, azulzinho, aos meus pés. Agora, se fode! Racha a cara até sangrar tudo!... Daqui a pouco, vou ficar ali, sentado no sofá, esperando o programa acabar pra ir dormir e esperar não morrer antes de acordar. Será? Espero que sim, sinal de inteligência. Pensar só dá fome. E eu tô cansado de ter fome. Pra puta que o pariu com o sentido da vida. Eu quero é morrer logo pra acabar com isso. Felicidade não existe nem em bula de remédio. Uma merda em cima da outra. É isso que sobra. Já que cagaram tudo em cima de mim, deixa eu cagar um pouco em cima dos outros. Agora, deixa eu ficar em paz, que um dia acaba. E até lá, não sei.
À vida feliz


A conversa acabou ali. Não tinha jeito. Ela saiu correndo e se escondeu em um canto, embaixo da prateleira que ficava no fim do corredor. Eu, fingindo não me importar nem um pouco, prendi a respiração e desci a escada até a rua. A noite estava fria e limpa. Pensei que podia morrer, um pouco antes dos pensamentos me fugirem todos da cabeça, que ficou vazia. Ser idiota, às vezes, é um privilégio pouco valorizado.

Acordei no dia seguinte, no meu quarto. Quarto pequeno e bagunçado. Prefiro andar na rua a ficar aqui. Andei por umas três horas. Repeti várias vezes o mesmo caminho. Andar sem ver, repassar em ruas mais de uma vez, é uma prática boa para organizar os pensamentos. A vida, muitas vezes, não está em você. Quase sempre. Naquele momento, menos ainda. O vazio podia, quem sabe, ser preenchido com as imagens repetidas. Carro. Azul, preto, branco, vermelho. Nunca amarelo. Cachorro, gato, velhos conversando (como eles conseguem?). Bêbado, criança, mulher fumando na porta da loja, garoto correndo, dois amigos conversando. E repete tudo. Mais uma vez. Sem parar. Espero o dia acabar pra sentir o gosto de que as coisas não se renovam.

À noite, de novo. Chego no meu quarto. O mesmo de quando saí. Preciso me livrar dos pequenos aprisionamentos. Nessas horas começo a sentir falta das palavras simples que podem sair da sua boca. Mas, de que adianta? Ontem você se encolheu e eu saí como um cachorro assustado. Amanhã, a rua vai ser repetida, e eu não vou querer olhar. Em algum momento, as coisas terminam. E para onde? A poesia, infelizmente, eu joguei no lixo. Ficou abandonada aquela noite, embaixo da prateleira no fim do corredor. A noite fria e linda pode virar dia e eu não vou nem notar. Porque não precisa. Ela fica bem e acontece mesmo sem mim. Será que eu estou pronto para não ficar?

Dormi.


...


Nunca esperaria te rever naquele lugar. Depois de meses, já tinha engolido tudo que eu poderia, um dia, querer sentir. Entrando no bar, às 11 da manhã, daquele dia tão normal que dava vontade de vomitar. Segurei a respiração e me policiei. Mas, no final, não. Você passou, me cumprimentou e eu só senti a brisa do seu corpo me tocar de leve. E nada mais.

7.02.2005

A mesma falta de horizonte


Andou três vezes o mesmo caminho. Padaria, bar, canteiro com o cachorro dormindo e praça onde os velhos sentiam o tempo sentados em um banco. Chegava sempre à falta de conclusões. Desenhava o mapa de suas caminhadas para ver se conseguia se reconhecer no que não estava nele. A cidade poderia ser muito mais reveladora do que sua própria falta de pensamentos. Talvez.

Penava quando caía a noite. A constatação da sua solidão era inexorável então. Não a solidão dolorosa, mas aquela na qual estamos mergulhados desde o momento em que nascemos. O mundo não era, senão para ele. As conversas de todos os dias pareciam ser sempre as mesmas e tinha quase certeza que a alegria de viver - se ela existia - estava no fato de que as pessoas conseguiam atravessar os dias mergulhadas até a cabeça na sua própria construção. Ele não. Precisava encontrar o sentido nas coisas fora dele, já que o interior já havia se mostrado tão asséptico como o lençol de uma cama de hospital.

Sua ocupação era a da resistência. Sabia que, na verdade, era uma busca sem resultados. Conseguia distinguir claramente a sua vontade do que lhe era apresentado. Ao mesmo tempo, a beleza da falta de sentido o instigava de uma maneira quase carnal. Poderia passar os seus dias degustando a objetividade vazia que absorvia. Amava as pessoas, amava o fato de que as pessoas são irredutivelmente sozinhas. E conseguia, ao final de uma jornada muito cansativa, finalmente, reconhecer-se igual. Árvore, mesa, cadeira. Livro, caderno, seu melhor amigo. Meio-fio, carro estacionado, mendigo na esquina e sua mulher. Seu cachorro e ele. Todos com a mesma falta de finalidade, cada um perplexo de sua própria maneira.

A felicidade, talvez, tivesse lhe chegado da maneira mais brutal. E sangrava ao mesmo tempo que aprazia. Paz.

Começava, então a se preparar. Tudo de novo...

6.13.2005

Sobre as coisas respiram e depois pensam
(um convite para qualquer hora)


Explodo a cada respiro
e transpiro a cada póro
que muda de lugar
ou que fica.

Vamos nos explodir.

5.28.2005

Happy me!

depois de anos
passo as noites acordados
esperando a grande explosão que pode me salvar
perco o sono escutando palavras
pipocarem no meu ouvido
gritando um pouco sob o escuro do quarto
suando a testa escostada sobre o travesseiro.
Enquanto conto a próxima última respiração
vejo os americanos fabricando as horas
acendendo e apagando os tubos da televisão
perco de vista
a paisagem bonita que degustei no mês passado
rimando merda
com o meu nome
morro por antecipação.

4.27.2005

Fechado

Perdido no ar
consigo diferenciar cada sopro
deitado sobre o meu ouvido
perceber as minúsculas
sílabas esquecidas
fazendo o foco sobre o detalhe
do sorriso mofado que preenche os póros
e os espaços entre os dentes
drogar na esquina da consciência tudo que me sufoca
e - andando de um canto a outro -
delimitar as fronteiras da viagem e retalhar
pedaço por pedaço
imagens amareladas
sobradas
da última refeição de anos.
Soprando a poeira da sombra que não foi
passeio em círculos rodeando o mesmo buraco
que ficou incrustrado no pedaço de carne
apodrecido na cozinha
do último apartamento.
Sofro o tormento calado
escondido atrás do cigarro
e de palavras inteligentes.
Desgastando
contente.

3.11.2005

Ponto final .

Irremediavelmente
procuro andar sob a luz escura do meu quarto
encontrar jesus crucificado na lata de Coca-cola
e fumar o cigarro amarrotado pelo tempo
molhado dentro do meu bolso.
Culpar-me por nascer febril
ardorosamente culpado
por simplesmente
atordoado e sutil
ter nascido
no dia em que a desordem
instalou-se nos meus pensamentos.
Correndo contra correntezas estranhas
retomo cacos de vidro quebrados há anos
colando-os em cada buraco
desoxigenado
dos músculos e respirações.
[- Segue o rumo disfarça o tormento
faz-se feliz e satisfeito
contido dentro do tempo
pouco
a pouco
corroendo].

2.21.2005

Sobre as coisas

Você está predestinado a isso. E ponto. Você estudou, você fez faculdade, você fez o estágio, ganhou o seu salário, conseguiu o emprego, saiu de casa, fez o que devia ser feito. Você aprendeu que ia ganhar o mundo preso em uma sala. Conheceria tudo tornando-se menor e mais limitado. Você sentiu isso. E as coisas são assim. Turvo como é. Acostumando-se a não pensar, a chegar e dormir, a obrigar-se a se divertir, a esquecer os questionamentos, dormir e acordar com horas marcadas, a conversar apressado, a comer e aproveitar para relaxar, a beber (ou fumar) para esquecer tudo que acontece quando não está bebendo (ou fumando), a perder o sono por causa do dia seguinte, a sentir o domingo amargo porque logo vem a segunda-feira. A repetir e repetir e repetir. Dia é dia e noite é noite. A vida é vida. E ponto. As coisas acabam. Cedo. Cada um faça o que quiser da morte diária que experimentamos.

E, de repente, percebe que pode viver e saber que pode morrer daqui a cinco minutos. Então foda-se todo o resto. Matéria é algo efêmero e ser humano é matéria. Um pouco mais metafísico, um pouco menos concreto, mas efêmero da mesma forma. Degustando a morte a cada respiração. E, por isso, vivendo de maneira mais honesta. Assim é mais saudável.

2.16.2005

tempo morto

peso o tempo
morto sobre a cabeça
esqueço o pouco
pensamento cortado
que varreu a carne viva
da lembrança
faço mira e escondo o tiro
dentro da tristeza
perco o rumo
na pequena esfera
translúcida que me redoma
a morte que me separa
ainda assim
de mim
o sol arrastado me atormenta
ainda assim
assim

2.01.2005

zum zum
(conversa de lugar)

Andando de lá pra cá
a vida está pra acabar
e eu acabo caindo
em mim
caindo
sem fim
dentro do sono que me corrompe.
Os nervos à flor da pele
não deixam cantarolar
pequenos restos de palavras
mofadas
guardadas
para talvez um dia
secar no armário
poesias deturpadas
que poderiam ser ar
mar
trazendo pra mim o frio e o sol.
[Anda
percebe o que me cerca]
Para continuar a queda
e fechar raciocínios
aquietar insônias
rachar a redoma mágica
e poder voar
cantar em silêncio
todas as notas brancas e amarelas
empoeiradas de algum canto
quebrar e sair assim
à escuridão somatizada
e realizada em cada grão
presente enfim.

1.27.2005

Hoje talvez

Sobre tudo que me comove
poesia torta que se encolhe com a chuva
brota do céu ensolarado
do janeiro destes outros tempos

Areia de praia dourada
fecho em pouco tempo
pensamentos inconclusos
afogados na água azul das minhas idéias
profundas celestes
apreendo pouco do agora
jogando ao futuro quase tudo que me enforca

Perco suor mas nunca respiração.

1.15.2005

Consciência

A janela suspirava atonitamente, chamando-o a pousar-se sobre ela e apreciar a melancolia mundana que se escorria por debaixo do seu nariz. O velho que andava na calçada, equilibrando-se na beirada do meio-fio, parecia suspeitar do desenho estranho e belo que compunha junto com os carros, o asfalto, o cinza e o barulho. Olhava rápidos olhares na direção das pessoas, como se buscasse confirmação da sua beleza efêmera. Poesia eterna que está presa em cada segundo.

Pôs-se a olhar a vista. Esperava que algo extraordinário o arrebatasse a qualquer canto do seu pensamento, onde estivesse longe de tudo aquilo que o perturbava. Mas a realidade estava mais na perturbação do que no suco que o esperava na geladeira. Muito mais. A tristeza é sempre muito mais concreta do que a felicidade. E a poesia vinha como um pote de sangue entornado pra dentro de sua cabeça. Não conseguia respirar. Sentia uma incômoda liberdade, que preenchia seus póros a ponto de espremer lágrimas para fora do seu olho. Perdia-se em meio a tantas coisas que lhe surgiam a um só momento. O mundo podia ser tão disponível, que lhe causava vertigens. A beleza triste de uma palavra engasgada pela noção absoluta da impossibilidade. Engasgada de tanta vontade.


(final em homenagem à Shady Lane)

1.13.2005

"I wanna ra(n)ge life..."

Dando passos sobre um chão invisível. O vento que vinha debaixo poderia fazê-lo voar para tão alto que perderia de vista as coisas reais.

Um alívio tão grande que sentia: poder se perder seria, de fato, a opção mais sensata naquele momento. Sentir um pouco do escuro e do claro talvez lhe desse precisamente o que necessitava.

Ar fresco. Luz pura. Um pouco de gelo no copo e alguns cigarros apagados. Percepção colorida de um mundo sem cores. Mas, ainda assim, com algum brilho. Pronto para um novo passeio.

1.11.2005

Encantamento

Ao pé da porta
pés descalços sobre o cimento quente
Esfria pensamentos com pequenos
sorrisos desmanchados
Perde o foco
sob a luz fria
na noite que sufoca
os meus respiros apressados

Corpo que afrouxa laços.