1.15.2005

Consciência

A janela suspirava atonitamente, chamando-o a pousar-se sobre ela e apreciar a melancolia mundana que se escorria por debaixo do seu nariz. O velho que andava na calçada, equilibrando-se na beirada do meio-fio, parecia suspeitar do desenho estranho e belo que compunha junto com os carros, o asfalto, o cinza e o barulho. Olhava rápidos olhares na direção das pessoas, como se buscasse confirmação da sua beleza efêmera. Poesia eterna que está presa em cada segundo.

Pôs-se a olhar a vista. Esperava que algo extraordinário o arrebatasse a qualquer canto do seu pensamento, onde estivesse longe de tudo aquilo que o perturbava. Mas a realidade estava mais na perturbação do que no suco que o esperava na geladeira. Muito mais. A tristeza é sempre muito mais concreta do que a felicidade. E a poesia vinha como um pote de sangue entornado pra dentro de sua cabeça. Não conseguia respirar. Sentia uma incômoda liberdade, que preenchia seus póros a ponto de espremer lágrimas para fora do seu olho. Perdia-se em meio a tantas coisas que lhe surgiam a um só momento. O mundo podia ser tão disponível, que lhe causava vertigens. A beleza triste de uma palavra engasgada pela noção absoluta da impossibilidade. Engasgada de tanta vontade.


(final em homenagem à Shady Lane)

2 comments:

Anonymous said...

sabe quando vc acorda com vontade de criar?
fazer coisas, exercitar a mente?
pois é, acordei assim.
beijus

Leo Azevedo said...

Eu sempre me pego parado, olhando pela janela, perdido em meus pensamentos em meio a concreto e gás carbônico!