5.31.2009

O sol esquenta às vezes. Noutras, ele é como uma sombra sem o escuro. Claridade para se ver: a pele ainda trinca e a perna treme.

A comida é boa, suficiente. E a conversa flui - às vezes passa rente aos ouvidos, mas isso já pode ser bastante para se esvaziar a mente. Inúmeras vezes fico parado, fingindo ouvir as frases, sem o menor interesse no conteúdo. Concentro-me nos gestos, e no mover das minhas mãos em diração ao prato.

***

É estranho como não consigo estar aqui o tempo inteiro. Assim, estando inteiro. Uma parte sempre escapa, escorrega pela frestinha que fica aberta nas horas mais inusitadas. Escapo assim, sem ruídos, mudo num encantamento esquisito que me prende aqui, deixando-me livre para não estar quando assim não me apraz. "Mas aqui não estou", sempre me vem essa intuição.

Lá, o oposto. Desde o acordar até o dormir, a única certeza que tinha - e terei sempre, suspeito - é de que lá estou a todo momento. Vôo livre e descuidado pelos mais espaços e tempos imaginários: porque nada me prende, mas solta-me para escolher lá estar o tempo todo. Aquela sensação me apraz, como se assim, estando inteiro, só assim, pudesse estar metade, um quarto, quantos fragmentos fossem, espalhados pelo ar, na certeza de alguma unidade que os une. Como nunca acreditei na liberdade, encontro a satisfação no pertencimento: um pouquinho de mim espalhado pelo vento. Lá, na casa, não me ocupo de mim jamais. Posso ser, desse jeito, puro esquecimento - sensação única e valiosa.

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